MARTINS, CYRO
PORTEIRA FECHADA
Capitão Fagundes, logo no começo do livro, está ocioso olhando as prateleiras vazias. Ele é um grosso, do tipo que bate na mulher, a Fausta; eles também têm filhos.
O povoado onde vivem é extremamente pobre, miserável.
Morre João Guedes – é assassinado ou suicidara-se? Volta ao passado para contar a história dele. Ele tem cinco filhos, dos quais apenas um é menino.
É expulso do pedacinho de chão do qual era arrendatário. O negócio da venda se deu sem o Guedes saber.
A mulher parece ser mais vivaz do que ele.
O seu Bento, que vendera a terra do Guedes para o Júlio Bica, suicida-se acossado pelas dívidas. Nessa, o ruim é o comprador da terra; o Bento tinha dívidas com ele e por isso foi obrigado a vender a terrinha do Guedes para saldá-las.
Guedes se dispõe prontamente a ajudar a família.
No começo dos capítulos há sempre uma referência ao velório do Guedes, ou, pelo menos, à sua morte.
Com o suicídio do Bento e a narrativa deslocando seu eixo central para ele, começo a pensar que o Guedes também suicidou-se.
Notar a quebra do tempo cronológico.
Notar também as questões políticas: o sobe e desce no poder.
O chefe, coronel Ramiro, depois que perdera o poder passou a freqüentar a igreja, para ao menos ser olhado pelos outros.
A esposa do Guedes é mais instruído do que ele, e o que ela ensina aos filhos, ele, sem querer, acaba “desensinando”. Maria José e o marido foram amparados pelo esposo de uma amiga dela, a qual (esta prima) não gostou de que ele o tenha feito. Notar isso: a parente da Maria José critica o marido, que não os conhece, por lhes ter ajudado, a eles que eram parentes dela.
Querubina, a prima, mostra-se arrogante e até brutal com Maria José, deixando bem clara a diferença de classe social que há entre elas. Ela até previne a filha dos piolhos que as primas podem ter.
Notar que o autor remete a isso literalmente: diferentes classe sociais.
Notar, por outro lado, o desejo de Maria José de ter o que Querubina tem.
O casal percebe logo o tamanho das dificuldades que terão pela frente, ele até mais do que ela, que ainda está impressionada. Todos os produtos são mais caros na cidade; o custo de vida é elevado.
Fagundes dorme só, quer dizer, na mesma cama de Fausta, porém Fausta não se deita mais COM ele: o casal, depois que ele ficara arruinado, só fala enquanto está brigando. NOTAR A RELEVÂNCIA DO DINHEIRO.
Fagundes anda atormentado pelas recordações de seu passado.
Guedes se torna ladrão e negocia seus furtos (peles de ovelha – NOTAR A MEDIOCRIDADE DAS COISAS QUE FURTA) com o Fagundes.
Notar que ele não vai decaindo, ou melhor, o narrador não expõe sua decadência, ele simplesmente apareceu um dia com o produto do roubo e foi vendê-lo ao Fagundes.
Uma das filhas (Isabel) foge com o namorado (fuga fruto da esperança de uma vida melhor), filho do Fagundes.
“Ultimamente, a própria Maria José o instigava ao furto, acossada pela pobreza.” 70 Uma página depois, ele é preso.
Notar que todos os homens casados parecem detestar suas esposas, as quais igualmente os detestam.
Maria José, depois de muito hesitar, resolve pedir ajuda à prima. Querubina resolve-se a ajudá-la muito mais pelo que os outros iriam pensar se ela não o fizesse do que por compaixão.
Querubina não gosta do marido, principalmente do jeito que ele volta do clube: sempre tarde e bêbado, ou, pelo menos, além de tarde tonto.
Todo mundo é muito parecido.
Querubina, tentando matar dois coelhos com uma cajadada só, quer dar a defesa do caso do Guedes para o noivo da filha, que já é formado em Direito mas ainda não advoga. Porém ele é o filho do fazendeiro que o Guedes roubou. É um playboizinho, um inútil filhinho de papai.
Querubina quer “fazer um homem daquele almofadinha”. 84
Ele, obviamente, recusa para não desafiar o papai.
Notar que a política é um mero jogo de interesses e troca de favores.
Até o Hélio, o almofadinha, vai receber uma nomeação como procurador.
João Guedes acostuma-se logo com a cadeia, parece até preferi-la.
“João Guedes em pouco tempo adaptara-se à vida na cadeia, que não lhe parecia das piores. Gozava ali de uma sensação de segurança de que havia muito se via privado. Prozeava com os outros presos, enchia mate para os soldados, pitava, comia e dormia. De cada vez que a Maria José ia vê-lo, achava-o mais arribado”. 90
Quando sai da prisão, fica muito angustiado, pois saía de uma prisão para outra pior. “Não haveria meio de voltar pra lá, pra cadeia?” 90
Na volta para casa, um ataque faz uma das filhas, a Tita, expirar. Isso foi precipitação do autor, ficou muito artificial.
Como a menina morrera de tuberculose, todos se afastam da família, e os trabalhos de costura da Maria José tornam-se ainda mais escassos.
Querubina manda-lhes diariamente UM litro de leite.
Guedes vende os arreios. É agora, definitivamente, um gaúcho “de a pé”. Notar que isso é um insulto à imagem que ele tinha do gaúcho. É o que de pior lhe poderia acontecer. É a perda de si mesmo, de sua identidade.
Notar que todos os personagens principais ou são miseráveis, coitados, ou "vermes desprezíveis". Não há meios termos.
Notar o João Biga, sempre vítima de chacotas, zombarias, e injustiças e surras. Ele é o limpador de latrinas.
Fagundes é obrigado pela Higiene a fechar o boliche. Como capanga do Ramiro, fizera muitas barbaridades.
João Biga, súbito, decide cavar para desenterrar um tesouro. Acaba sendo atropelado pelo Hélio, que pensara ter pego um cachorro. O João Biga não morre, apenas fica levemente ferido, sobrevive para continuar sofrendo.
O livro lembra Vidas Secas e O quinze.
Fagundes enlouquece.
No final, o autor volta ao campinho do Guedes, onde nada mais há de humano, “Mas que engorde dava aquela invernada!” 127
Observações: Cyro Martins compõe a trilogia do gaúcho a pé, em oposição ao centauro dos pampas e o monarca das coxilhas. Sem rumo (1937), Porteira Fechada (1944), Estrada Nova (1953).
Essa trilogia, contudo, não é uma seqüência, diz-se trilogia por causa da congruência da temática, isto é, o gaúcho pobre, que não tem onde morar e até mesmo nem o que comer. Ao mesmo tempo que tem aspectos regionalistas, ele, ao colocar esses aspectos numa situação de “crise”, faz uma crítica à sociedade.
Notar o êxodo rural.
O gaúcho que vai sendo empurrado pelas circunstâncias, sem nenhuma possibilidade de tornar-se herói, porque os textos não apresentam uma possibilidade de resolução do problema.
Os problemas, apesar de o autor ter sido psicanalista, não estão no plano psicológico, e sim no plano físico, o que diferencia seus textos dos de Dyonélio Machado, sobretudo de Os ratos.
Notar a Maria José e a Querubina, que apesar de serem de classes sociais diferentes têm entre si um paralelo. Além do mais, elas são parentes.
João Guedes não tinha consciência da sua exploração quando estava no campo: ele tinha o que comer, então estava bom, ou pelo menos, era o bastante.
O Fagundes explora quem ele pode para manter seu “poder”, pelo menos para satisfazer a sua própria necessidade.
A imagem do gaúcho não nasce na literatura, ela faz parte do imaginário popular do Rio Grande do Sul.
PORTEIRA FECHADA
Capitão Fagundes, logo no começo do livro, está ocioso olhando as prateleiras vazias. Ele é um grosso, do tipo que bate na mulher, a Fausta; eles também têm filhos.
O povoado onde vivem é extremamente pobre, miserável.
Morre João Guedes – é assassinado ou suicidara-se? Volta ao passado para contar a história dele. Ele tem cinco filhos, dos quais apenas um é menino.
É expulso do pedacinho de chão do qual era arrendatário. O negócio da venda se deu sem o Guedes saber.
A mulher parece ser mais vivaz do que ele.
O seu Bento, que vendera a terra do Guedes para o Júlio Bica, suicida-se acossado pelas dívidas. Nessa, o ruim é o comprador da terra; o Bento tinha dívidas com ele e por isso foi obrigado a vender a terrinha do Guedes para saldá-las.
Guedes se dispõe prontamente a ajudar a família.
No começo dos capítulos há sempre uma referência ao velório do Guedes, ou, pelo menos, à sua morte.
Com o suicídio do Bento e a narrativa deslocando seu eixo central para ele, começo a pensar que o Guedes também suicidou-se.
Notar a quebra do tempo cronológico.
Notar também as questões políticas: o sobe e desce no poder.
O chefe, coronel Ramiro, depois que perdera o poder passou a freqüentar a igreja, para ao menos ser olhado pelos outros.
A esposa do Guedes é mais instruído do que ele, e o que ela ensina aos filhos, ele, sem querer, acaba “desensinando”. Maria José e o marido foram amparados pelo esposo de uma amiga dela, a qual (esta prima) não gostou de que ele o tenha feito. Notar isso: a parente da Maria José critica o marido, que não os conhece, por lhes ter ajudado, a eles que eram parentes dela.
Querubina, a prima, mostra-se arrogante e até brutal com Maria José, deixando bem clara a diferença de classe social que há entre elas. Ela até previne a filha dos piolhos que as primas podem ter.
Notar que o autor remete a isso literalmente: diferentes classe sociais.
Notar, por outro lado, o desejo de Maria José de ter o que Querubina tem.
O casal percebe logo o tamanho das dificuldades que terão pela frente, ele até mais do que ela, que ainda está impressionada. Todos os produtos são mais caros na cidade; o custo de vida é elevado.
Fagundes dorme só, quer dizer, na mesma cama de Fausta, porém Fausta não se deita mais COM ele: o casal, depois que ele ficara arruinado, só fala enquanto está brigando. NOTAR A RELEVÂNCIA DO DINHEIRO.
Fagundes anda atormentado pelas recordações de seu passado.
Guedes se torna ladrão e negocia seus furtos (peles de ovelha – NOTAR A MEDIOCRIDADE DAS COISAS QUE FURTA) com o Fagundes.
Notar que ele não vai decaindo, ou melhor, o narrador não expõe sua decadência, ele simplesmente apareceu um dia com o produto do roubo e foi vendê-lo ao Fagundes.
Uma das filhas (Isabel) foge com o namorado (fuga fruto da esperança de uma vida melhor), filho do Fagundes.
“Ultimamente, a própria Maria José o instigava ao furto, acossada pela pobreza.” 70 Uma página depois, ele é preso.
Notar que todos os homens casados parecem detestar suas esposas, as quais igualmente os detestam.
Maria José, depois de muito hesitar, resolve pedir ajuda à prima. Querubina resolve-se a ajudá-la muito mais pelo que os outros iriam pensar se ela não o fizesse do que por compaixão.
Querubina não gosta do marido, principalmente do jeito que ele volta do clube: sempre tarde e bêbado, ou, pelo menos, além de tarde tonto.
Todo mundo é muito parecido.
Querubina, tentando matar dois coelhos com uma cajadada só, quer dar a defesa do caso do Guedes para o noivo da filha, que já é formado em Direito mas ainda não advoga. Porém ele é o filho do fazendeiro que o Guedes roubou. É um playboizinho, um inútil filhinho de papai.
Querubina quer “fazer um homem daquele almofadinha”. 84
Ele, obviamente, recusa para não desafiar o papai.
Notar que a política é um mero jogo de interesses e troca de favores.
Até o Hélio, o almofadinha, vai receber uma nomeação como procurador.
João Guedes acostuma-se logo com a cadeia, parece até preferi-la.
“João Guedes em pouco tempo adaptara-se à vida na cadeia, que não lhe parecia das piores. Gozava ali de uma sensação de segurança de que havia muito se via privado. Prozeava com os outros presos, enchia mate para os soldados, pitava, comia e dormia. De cada vez que a Maria José ia vê-lo, achava-o mais arribado”. 90
Quando sai da prisão, fica muito angustiado, pois saía de uma prisão para outra pior. “Não haveria meio de voltar pra lá, pra cadeia?” 90
Na volta para casa, um ataque faz uma das filhas, a Tita, expirar. Isso foi precipitação do autor, ficou muito artificial.
Como a menina morrera de tuberculose, todos se afastam da família, e os trabalhos de costura da Maria José tornam-se ainda mais escassos.
Querubina manda-lhes diariamente UM litro de leite.
Guedes vende os arreios. É agora, definitivamente, um gaúcho “de a pé”. Notar que isso é um insulto à imagem que ele tinha do gaúcho. É o que de pior lhe poderia acontecer. É a perda de si mesmo, de sua identidade.
Notar que todos os personagens principais ou são miseráveis, coitados, ou "vermes desprezíveis". Não há meios termos.
Notar o João Biga, sempre vítima de chacotas, zombarias, e injustiças e surras. Ele é o limpador de latrinas.
Fagundes é obrigado pela Higiene a fechar o boliche. Como capanga do Ramiro, fizera muitas barbaridades.
João Biga, súbito, decide cavar para desenterrar um tesouro. Acaba sendo atropelado pelo Hélio, que pensara ter pego um cachorro. O João Biga não morre, apenas fica levemente ferido, sobrevive para continuar sofrendo.
O livro lembra Vidas Secas e O quinze.
Fagundes enlouquece.
No final, o autor volta ao campinho do Guedes, onde nada mais há de humano, “Mas que engorde dava aquela invernada!” 127
Observações: Cyro Martins compõe a trilogia do gaúcho a pé, em oposição ao centauro dos pampas e o monarca das coxilhas. Sem rumo (1937), Porteira Fechada (1944), Estrada Nova (1953).
Essa trilogia, contudo, não é uma seqüência, diz-se trilogia por causa da congruência da temática, isto é, o gaúcho pobre, que não tem onde morar e até mesmo nem o que comer. Ao mesmo tempo que tem aspectos regionalistas, ele, ao colocar esses aspectos numa situação de “crise”, faz uma crítica à sociedade.
Notar o êxodo rural.
O gaúcho que vai sendo empurrado pelas circunstâncias, sem nenhuma possibilidade de tornar-se herói, porque os textos não apresentam uma possibilidade de resolução do problema.
Os problemas, apesar de o autor ter sido psicanalista, não estão no plano psicológico, e sim no plano físico, o que diferencia seus textos dos de Dyonélio Machado, sobretudo de Os ratos.
Notar a Maria José e a Querubina, que apesar de serem de classes sociais diferentes têm entre si um paralelo. Além do mais, elas são parentes.
João Guedes não tinha consciência da sua exploração quando estava no campo: ele tinha o que comer, então estava bom, ou pelo menos, era o bastante.
O Fagundes explora quem ele pode para manter seu “poder”, pelo menos para satisfazer a sua própria necessidade.
A imagem do gaúcho não nasce na literatura, ela faz parte do imaginário popular do Rio Grande do Sul.